domingo, 27 de janeiro de 2008

Protótipo do Pavão Misterioso, de madeira, criado por Guilherme de Faria







Este "Pavão Misterioso" é um objeto de arte, feito inteiramente de madeira, sem pregos, colado e com cavilhas (e assinado) a partir do design do próprio artista em xilogravura criada para ilustrar a capa do folheto de sua versão do tema do Romance do Pavão Misterioso, tradicional do cordel nordestino.( Curiosidade: um mecanismo de madeira com duas pequenas alavancas faz abrir e fechar a cauda em leque do pavão).

Um Outro Pavão Misterioso

(cordel de autoria de Guilherme de Faria)

1
Ouça agora minha gente
Uma estória de chorar.
Não verá mais comovente
O povo deste lugar.

2
Foi começo da desdita
Desta terra do Sertão
Uma moça tão bonita
Que igual se viu mais não.

3
Não era princesa de sorte
Mas era de condição,
Por ela comanda a Morte
Sete guerras no Sertão.

4
Morreu gado morreu gente,
Fazenda mudou de mão,
Mudou o rumo do mundo,
Só o seu não mudou não.

5
Essa moça tão formosa
Vivia pro coração,
Estava ficando famosa
Por causa desse condão.

6
Seu pai era um um rei da terra
Homem afeito à guerra,
Menos cruz e mais canhão,
(mas no fundo um hóme bão)


7
Queria pra sua filha
Palácio de maravilha,
Montanha de rapadura,
Açude de grozelhão.

8
Entre sina e sinecura
Não adiantou a ternura,
Não muda o querer da gente
O fado ruim de um vivente.

9
Estava escrito que Creusa
(esse o nome da princesa)
Por tão amorosa ser
Muito havia de sofrer

10
Por um moço carinhoso
Um tal José Engenhoso,
Pobre como um faquir
Não podendo competir

11
Com o filho do coronel
Que se pavoneando
Vivia só rodeando
Como uma mosca no mel,

12
Então construiu maquinário
Feito de ferro e de galho
Com a forma de um pavão
Movido à força e paixão.

13
E com este estratagema
Com aqueles olhos de gema
Voou por esse sertão
Com motor de combustão.

14
O povo vendo voar
Aquele estranho avejão
Dizia que tinha chegado
A redenção do Sertão.

15
Que a terra aguardasse água,
Sem enchente como duna
De um dilúvio sem mágoa,
Sem a arca como escuna.

16
Sem rola, graúna e até
Sem casal de hienas risonhas,
E sem as duplas bisonhas
Do patriarca Noé.

17
O verde que ia voltar
Traria o prazer da vida
E a fartura tão querida
Pro povo daquele lugar.

18
Mas, ai, que o travo do Mal
Não deixa um gosto vingar,
Já se armara o seu rival
Com canhão de militar

19
Ao saber que o moço a bela
Já lhe tinha arrebatado
Por expresso gosto dela
Que se tinha apaixonado.

20
Voavam os dois abraçados
Por cima dessa caatinga
Quando fogos cerrados
Partiram da seca restinga

21
Formando nuvem vermelha
Em volta do Avejão
Produzindo uma centelha
Que causou a explosão.

22
Não adianou voar de esguelha,
Nem lupim nem parafuso,
Pois nessa teia, o fuso
O Fado é que tem na mão.

23

Caiu por terra o casal
Caiu por terra o Pavão
Caiu pra sempre o ideal
De haver chuva no Sertão.


FIM

2001

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